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03/09/2020

STF decide a incidência de ITBI na integralização de bens imóveis em repercussão geral

03/09/2020

Obscuridade no texto de tese firmada dá margem à discussão entre municípios e contribuintes sobre a incidência do imposto.

No dia 05 de agosto de 2020, o Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou, no Recurso Extraordinário 796.376, em repercussão geral, a incidência do Imposto Sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) na conferência de bens imóveis ao capital social de sociedades. Foi firmada a seguinte tese:

“A imunidade em relação ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado.”

Pode-se extrair, da leitura isolada do texto da tese firmada, que, ao integralizar quotas ou ações de uma sociedade com bens imóveis, incide o ITBI sobre a diferença entre o valor arbitrado pelo Fisco Municipal ao imóvel e o valor utilizado para integralização do capital (normalmente, o valor do custo de aquisição). Nesse sentido, há a preocupação dos contribuintes de que a intepretação do texto da tese de forma apartada do acórdão possa dar força a esse posicionamento já adotado por munícipios, que podem utilizar da brecha deixada pelo Ministro Alexandre de Moraes no texto para reforçar seu argumento quanto ao tema.

Essa tese dos municípios, contudo, não deve prosperar, porque o caso julgado pelo STF é extremamente particular. Trata-se de sociedade limitada a que se atribuiu o capital social de R$ 24.000,00, integralizado pelos sócios mediante a cessão à sociedade de bens imóveis cujo o valor a eles atribuído, a custo de aquisição, foi de R$ 802.724,00. A diferença de R$ 778.724,00 foi destinada à formação de reserva de capital, isto é, conta distinta da de capital social.

A intepretação do STF, entretanto, é de que a imunidade dada pelo constituinte refere-se apenas ao valor do imóvel destinado à formação do capital social, e não a qualquer outra destinação dada pelos sócios, tal como a formação da reserva de capital. Assim, veja-se o texto constitucional (art. 156, § 2º, I):

“não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil”.

De fato, a literalidade da Constituição diz que está imune do ITBI apenas a transmissão dos bens imóveis “incorporados ao patrimônio da pessoa jurídica em realização de capital”. Porém, ainda que dessa intepretação em sentido denotativo se conclua pela incidência do ITBI sobre os valores advindos de integralização com imóveis e destinados à conta contábil diversa da de capital social, não cabe dizer que o STF decidiu pelo dever de se recolher o imposto sobre a diferença entre o valor arbitrado pelo Fisco Municipal ao imóvel e o valor utilizado para integralização do capital.

Na verdade, a confusão sobre a intepretação da tese passa pelo fato de que os municípios pretendem se favorecer de benefício dado aos contribuintes pela lei federal. Explica-se: o art. 23 da Lei nº 9.242/95, ao tratar do Imposto de Renda, prevê que pessoas físicas possam transferir bens à pessoa jurídica pelo valor constante de suas declarações de renda (custo de aquisição) ou pelo valor de mercado (normalmente, próximo ao valor arbitrado pelos municípios). A valor de custo de aquisição, não há incidência de Imposto de Renda; a valor de mercado, incide o tributo sobre o ganho de capital.

Portanto, fosse essa a decisão do STF, o cenário da transferência de bens imóveis em formação do capital social estaria estrito a duas hipóteses: (i) ou se integraliza a valor de mercado, paga-se o Imposto de Renda sobre o ganho de capital, e aí se tem a imunidade do ITBI; (ii) ou se integraliza a valor de custo de aquisição e recolhe-se ITBI sobre a diferença entre o valor dado imóvel pelo município e o valor utilizado no aumento de capital.

Uma vez que essa intepretação passa por obscuridade no texto da tese firmada pelo STF, não se vê qualquer perspectiva de êxito dos municípios em autuações pelo não recolhimento do ITBI. Efetivamente, o STF não decidiu pela incidência de ITBI sobre a diferença entre o valor de mercado do imóvel e o valor de custo de aquisição utilizado para integralização de capital social.

Tiago Haubrich Braum

Estagiário na Pimentel & Rohenkohl Advogados Associados

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