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02/10/2020

Empresa adota nova via e paga ICMS sobre software

29/09/2020

Por Adriana Aguiar

Enquanto o STF não define a questão, estratégia blinda companhia de eventuais autuações fiscais

Uma empresa de tecnologia dedicada ao licenciamento de softwares adotou uma estratégia pouco comum na Justiça para blindar-se de eventuais autuações, enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) não decide se o setor deve pagar ISS ou ICMS. A companhia entrou com uma ação chamada de consignação em pagamento para que o juiz defina se a empresa deve impostos ao Estado ou ao município.

Ao analisar o caso, o juiz Jean Thiago Vilbert Pereira, da 1ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo, decidiu pelo pagamento de ICMS, com alíquota de 5%. A do ISS seria de 2%. Esses valores agora devem ser depositados judicialmente (processo nº 1015943-17.2019.8.26.0053). Apesar de o juiz ter optado pelo ICMS, o advogado que assessora a empresa Mediatech Consultoria em Tecnologia afirma que existem vantagens na estratégia. “Primeiro, o cliente fica em uma situação confortável, já que a ação vira um conflito entre o Estado e o município”, diz.

A decisão, acrescenta, blinda a empresa de eventuais autuações. Ela deposita judicialmente o ICMS, afirma, e se tiver que reaver valores, em uma eventual decisão do Supremo pelo ISS, bastará resgatar o dinheiro que está na conta judicial. “Será muito mais fácil”, diz o advogado.

A maioria das empresas do setor entra na Justiça para recolher o ISS, com a alegação de que existe previsão expressa na Lei Complementar nº 116, de 2003. Muitas foram beneficiadas por liminares obtidas por entidades de classe, em mandados de segurança. Existem ainda aquelas que simplesmente pagam o tributo – com o risco de serem autuadas pelo Estado.

No caso dessas empresas, segundo o advogado da empresa, caso o Supremo decida pelo ICMS, terão que pagar o imposto devido ao Estado e entrar com pedido judicial para restituição dos valores recolhidos de ISS. “Vira um precatório municipal. O contribuinte pode ficar anos na fila para receber.”

No processo, a Mediatech afirma se dedicar ao licenciamento de programas de computação padronizados (software de prateleira) – desprovidos de meios físicos, por meio do chamado cloud computing -, adquiridos de terceiros. E que teria dúvida entre o recolhimento de ISS ao município de São Paulo, conforme a Lei Complementar nº 116/2003 (item 1.05), e o pagamento de ICMS ao Estado, com base na cláusula 3ª do Convênio ICMS nº 106/2017.

Na sentença, antes de definir a questão, o juiz Jean Thiago Vilbert Pereira fez um desabafo: “O Brasil é mesmo um país complicado. O empresário sequer sabe a quem pagar. O presente processo é ilustrativo. Ambos os entes argumentam em várias páginas pela incidência do imposto aos seus cofres. Não há como um país assim se desenvolver. Uma pena”.

Ao tratar do conflito, destaca que existem quatro ações diretas de inconstitucionalidade no STF questionando a incidência de ICMS sobre software (ADI 1945, ADI 5576, ADI 5659 e ADI 5958). Ele acrescenta que também está em andamento um recurso extraordinário (RE 688223), em repercussão geral, que examinará a incidência de ISS sobre contratos de licenciamento ou de cessão de programas de softwares desenvolvidos para clientes de forma personalizada.

Sobre o caso, afirma que a empresa nada mais exerce que um papel de intermediadora para a entrega dos softwares aos clientes, “ainda que a denomine de licenciamento”. “Não há verdadeira customização apta a configurar prestação de serviços”, diz.

Para embasar a opção pelo ICMS, o magistrado cita julgamento antigo do Supremo, que decidiu pela incidência do ICMS sobre o software de prateleira (RE 176626), e liminar em ação direta de inconstitucionalidade (ADI 1945) que declarou a constitucionalidade do artigo 2º, parágrafo 1º, item 6, da Lei nº 7.098/98, do Estado do Mato Grosso do Sul, que tratou da incidência do ICMS, em 2011.

Segundo advogado que assessora empresas e é advogado da Confederação Nacional de Serviços (CNS) na ADI 5659, a estratégia adotada pela Mediatech é realmente pouco usada. “Porque te obriga a recolher o maior dos valores. Mas com o objetivo de não correr riscos, ela funciona bem”, afirma ele, acrescentando que sentenças favoráveis ao ICMS em São Paulo têm sido reformadas. O Tribunal de Justiça (TJ-SP) tem decidido pelo ISS.

Em nota, a Procuradoria Geral do Município de São Paulo informa que adotará “as medidas recursais pertinentes” quando for formalmente intimada. Ainda afirma que a discussão está pendente no STF e que a decisão se confunde ao dizer que há entrega de software e, por isso, haveria circulação de mercadoria. “Entrega pressupõe o cliente da empresa adquirir a propriedade do software, e não é isso que ocorre no licenciamento de software”, diz.

Na nota, acrescenta que a decisão “se vale de jurisprudência ultrapassada – que já está superada – do STF, uma de 1998 e outra de 2010, desconsiderando decisões mais recentes, como a do RE 651703, julgada em 2016”.

Já a Procuradoria Geral do Estado de São Paulo afirma em nota que a decisão está de acordo com o posicionamento do governo paulista.

Fonte: Valor Econômico

 

 

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